o quarto mal amado

o amor que comeu meu nome, minha identidade, meu retrato, foi devorado
sem piedade pelo comercial de cigarro na pausa do reality que comeu
meus pés que sobreviveram ao amor

e diluído em refrigerante, meu pensamento

na cozinha
onde comia comida
hoje como nomes
classificações científicas

carboidratos
proteína

melanina

eu como protetor solar
pra poder chegar até a calçada

na esquina
o ônibus me diz onde todos vão
mesmo que não saiba quem são

e até me diz
que fujo todo dia do meu lar
pra poder ser digno de tê-lo

pago uma casa
onde as vezes nem consigo deitar na cama dentro dela
que também tive que pagar

e quando
no começo do outro dia
eu chego em casa
me jogo em veias de zinco
me ligando ao mundo
pra entrar na conta
que controla minha vida

e como pra escapar
acesso meu amor virtual
que come meu Estado e minha cidade

a conexão comeu minha paz e minha guerra.
Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão.
Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

Comentários

Anônimo disse…
Você referenciou um dos meus textos favoritos de toda a vida sem faltar com o respeito. Gostei muito, cara.

Quem me dera só o amor me devorasse.
Unknown disse…
O amor devora ímpios e puros. Quando se lê o texto, perde-se a pureza e ganha liberdade de poder devorar e amar.

Muito bom o texto. Gostei muito!
Desculpe-me pela ausênciaaaaaa

- [to meio descompassado no tempo.]

a primeira estrofe e a ultima são de uma reflexão imensaaa - vou gravar esse, tenho um caderno que registro poemas de amigos e o teu ta garantido lá.

Abraços!

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